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Vinicius Jr. e as histórias do racismo no esporte

O jogador entrará para a história da luta contra o racismo no esporte


O jogador VIni Jr. com a camisa do Real Madrid, dentro do campo,aponta para os torcedores que o xingavam
Vini Jr. reage às provocações de torcedores do Valencia

REUTERS/Pablo Morano


O jogo


Passada uma semana dos acontecimentos envolvendo o cidadão brasileiro e craque do Real Madri, Vinícius José Paixão de Oliveira Júnior, de 22 anos, vítima de racismo durante o jogo do seu time contra o Valencia pelo campeonato espanhol, deverão entrar para a história do futebol e do esporte, como um marco da luta contra o racismo. A atitude indignada do jogador diante dos gritos de “mono” ou “macaco”, em português, entoados pela torcida valenciana e os acontecimentos seguintes, os levam a ocupar um lugar na história.


Racismo no futebol brasileiro


Quando surgiram os primeiros clubes de futebol no Brasil, no início do Século XX, os negros eram excluídos dos clubes que dominavam as ligas do Rio de Janeiro e de São Paulo, com a predominância de jogadores brancos e pertencentes à elite.

Apesar do forte racismo, o primeiro grande ídolo da modalidade no país foi justamente um jogador negro, Arthur Friedenreich, filho de um rico comerciante alemão com uma lavadeira negra brasileira. O atacante, com passagens em diversos clubes e seleção brasileira, se disfarçava de não mulato, esticando os cabelos, usando gorros ou cobrindo a pele com pó de arroz, como fazia o jogador do Fluminense Carlos Alberto.

O sistema de exclusão vigente fez com que o presidente Epitácio Pessoa vetasse a presença de Friedenreich em um torneio na Argentina, em 1921, para evitar que os brasileiros fossem chamados de “macaquitos” pelos torcedores argentinos.


A atitude de Vinicius Jr.


Voltando aos acontecimentos do dia 21 de maio passado, no estádio do Valencia, o que pode ter motivado as reações contundentes nesse caso, se atos semelhantes têm sido recorrentes em vários países nos últimos tempos, sem a mesma repercussão?

As reações do jogador, desde os primeiros momentos dos xingamentos racistas, resultaram numa sequência de manifestações e pronunciamentos condenando a atitude da torcida e apoio a Vini Jr. O alto comissário da ONU para Direitos Humanos, Volker Turk, condenou os ataques racistas ao jogador. O ocorrido foi um “lembrete alarmante da prevalência do racismo no esporte”, disse o dirigente.


O primeiro aspecto a chamar atenção, e comover o público, foi a reação indignada do jogador, que partiu para a arquibancada e foi tomar satisfação com um dos torcedores agressores. Foi o momento de reagir contra o preconceito, na mesma medida da agressão sofrida, naquele momento e nas ocasiões durante seu período na Espanha. Para agir daquela forma, acredito que ele possua uma autoestima bem construída. Em outro aspecto, revelou-se a consciência cidadã dele, pouco vista nos atletas de futebol e outros esportes: a noção exata dos direitos da pessoa e da liberdade.

Assim, Vini Jr. agitou a opinião pública para que sejam revistas as convicções supremacistas dos espanhóis e de tantos outros pelo mundo. Impressiona, ainda, nas declarações, à capacidade de argumentação.

“O campeonato que já foi de Ronaldinho, Ronaldo, Cristiano e Messi, hoje é dos racistas”, postou Vini Jr nas redes sociais. Ele pôs os espanhóis no “divã”, ao lamentar por aqueles que não concordam com o racismo, “mas hoje, no Brasil, a Espanha é conhecida como um país de racistas”.

Os acontecimentos daquele jogo em Valencia, e o que vem ocorrendo a posteriori, vão escrevendo um novo momento da história na luta contra o racismo. Assim, o jogador, certamente, entrará para a galeria de outros ídolos do esporte, como Jesse Owens, Tommie Smith e John Carlos.


Jesse Owens vs Adolf Hitler

o atleta Jesse Owens no pódio em 1º lugar no estádio durante as Olimpíadas de Berlim em 1936
Jesse Owens em 1º lugar no pódio durante a Olimpíada de Berlim, 1936

Dentre os acontecimentos históricos de racismo no esporte, um dos mais impactantes, a simbolizar a luta pela igualdade racial, foi protagonizada pelo americano Jesse Owens. Durante as Olimpíadas de Berlim, em 1936, com apenas 23 anos (um ano a mais que Vini Jr atualmente), Owens, neto de escravos, nascido no Alabama, Estados Unidos, conquistou quatro medalhas de ouro, nas provas dos 100 m rasos, salto em distância, 200 m rasos e revezamento 4 x 100 m. O chanceler alemão Adolf Hitler, organizou os Jogos Olímpicos de Berlim com a intenção de promover a ideologia do partido nazista e, principalmente, a supremacia da “raça superior” ariana.


A ideia supremacista do nazismo começava a se desfazer ali, para a decepção de Hitler, presente ao estádio. A importância do desempenho de Owens e o seu significado não podem ser esquecidos nos tempos atuais. Apesar das conquistas e do reconhecimento internacional, o atleta não teve o mesmo reconhecimento por seu próprio governo. “Embora não tenha sido convidado para apertar a mão de Hitler, também não fui convidado à Casa Branca para aperta a mão do presidente (Franklin Roosevelt), declarou Owens.


"Racismo não, basta!"

Tommie Smith e John Carlos no pódio durante as Olimpíadas do México em 1968., com luvas pretas e braço erguido., simbolizando a luta contra o racismo nos EUA
Tommie Smith e John Carlos durante as Olimpíadas do México em 1968.

Outro momento marcante da luta contra o preconceito e uma das imagens mais emblemáticas da história do esporte foi a cena protagonizada pelos atletas negros americanos Tommie Smith e John Carlos durante as Olimpíadas do México em 1968. Tommie, com a medalha de ouro conquistada na prova dos 200 metros rasos e John, com a medalha de bronze conquistada na mesma prova, descalços, para simbolizar a pobreza dos negros, cabisbaixos e calados durante a execução do hino nacional americano, erguem os punhos cerrados reproduzindo o símbolo de saudação do movimento Black Power dos Panteras Negras. Havia três meses que o líder do movimento negro nos EUA Martin Luther King tinha sido assassinado.

Ao reproduzirem o gesto dos Panteras Negras, Tommie e John estavam dizendo para o mundo “Racismo não, basta!”. Posteriormente, os atletas foram banidos dos Jogos por determinação do Comitê Olímpico Internacional (COI) por terem usado o esporte como manifestação sociopolítica.


Agora, nesse momento da história, abre-se a oportunidade para um novo protagonista. Segue firme, Vinicius Jr., superando teus adversários com maestria e talento, dentro de campo; e com coragem e sabedoria ensinando que é preciso superar o racismo, também fora do campo.


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